São muito diferentes as corridas de ciclismo e aquelas de cicloturismo em que costumo participar em Espanha.
No cicloturismo, em que normalmente só uma pequena parte do percurso é que é efectuada em sistema de roda-livre, não há estratégias de equipas, é tudo ao molho e fé em Deus. No ciclismo, um sprinter não se interessa pelas etapas de montanha, nem um escalador se faz a um sprint.
No cicloturismo pretendemos sempre fazer o melhor possível, acabe a roda-livre numa recta ou numa subida. Se pudermos ficar no lugar 170 não queremos ficar no 171. Para os ciclistas profissionais ou elite, é-lhes igual em que lugar ficam, se não puderem disputar um dos lugares do pódio.
Acresce a estes factos, que num pelotão de cicloturistas que disputam um pequeno percurso de roda-livre, se misturam todas as categorias possíveis, desde júniores até aos master de 7o anos, pelo que, mesmo chegando entre os últimos, se pode estar a disputar o 1º lugar da nossa categoria etária, sendo que cada lugar na classificação é importante, e isto conduz a verdadeiras batalhas entre grupos menores.
No ciclismo profissional, se há uma fuga, o pelotão organiza-se para a anular, com as equipas interessadas na anulação da fuga a trabalharem nesse sentido. As equipas que não estão nessa luta optam por descansar, indo relaxadamente na roda das que trabalham, se tal lhes for possível.
No cicloturismo é cada um por si, a equipa não significa nada, pode mesmo acontecer que numa única equipa hajam candidatos a vencerem em categorias etárias diversas.
Veio-me à memória um episódio passado numa das primeiras vezes que ousei correr numa cicloturista espanhola.
Tinha ido à Etapa de la Vuelta ao Calar Alto, tinha aguentado, pensei que podia experimentar outra vez. Como a esposa e o filho estavam de férias, consegui organizar as coisa para irmos 3 dias, aproveitando para revisitar El Puerto de Santa María, que adoramos, e aí ficar num hotel, e participar na Ruta Cicloturista Los Alcornocales - Clásica Montera del Torero, na região de Algeciras.
A minha experiência era nula, mas a minha vontade era incomensurável.
Às tantas vi-me num grupo de 14 ou 15 corredores, e por falta de sabedoria, e sentindo-me forte, logo me coloquei à frente deles, aproveitando os outros naturalmente o meu esforço, seguindo na minha roda.
De repente salta um jovem, procurando distanciar-se. Nem pensar!! Julguei cá para mim...
Saltei atrás dele e só descansei quando ele abdicou da fuga.Vitória! Senti cá dentro!!!
E eis que salta outro!!! E eu a dar-lhe caça logo a seguir. Mais uma vitória!!!
E assim por vários quilómetros.
Ninguém tinha autorização para sair daquele mini-pelotão, que eu não deixava...
Sentia-me o herói do dia, o Lance Armstrong do Montechoro...felicíssimo com a tareia que lhes estava a dar...Cada passo era uma pequena vitória!!!
E de repente, assim como se eu nem existisse, foram-se todos embora, ignorando-me completamente...Mantendo o pedalar constante com que sempre vieram continuaram estrada fora, e eu, esgotado pelas investidas palermas, e pelo puxar constante, fiquei vazio, sem força sequer para seguir na roda deles...aprendendo uma lição para o resto da vida.
Dizia o Che Guevara:"de derrota em derrota até à vitória final". Para mim foi de "vitória em vitória até à derrota final", pelo menos contra aqueles que formaram aquele pequeno pelotão.
Quem me dera pedalar minha bike aí na Europa! Por enquanto, difícil, mas um dia... quem sabe. Gostei do blog. Abraço.
ResponderEliminarCaro Amigo Santos, quando se vai correr a Espanha, para mim, a máxima é: enquanto houver um espanhol vivo, não há português que puxe!
ResponderEliminar:-)
Grande e saudoso abraço, companheiro!